sábado, 28 de novembro de 2015

Dignidade e capitalismo

A dignidade da pessoa humana se correlaciona diretamente ao conceito de “mínimo existencial”, ou seja, a certos bens, oportunidades ou direitos cuja privação é considerada intolerável na medida em que se aviltaria a existência do ser naquela sociedade em que vive. Cite-se, por exemplo, o acesso à água potável, ao alimento, à higiene pessoal, á educação básica e ao salário condizente para que se possa prover este mínimo para toda família.´

O capitalismo é o sistema socioeconômico em que os meios de produção (terras, fábricas, máquinas, edifícios, negócios) e o capital (dinheiro) são propriedade privada, ou seja, tem dono. O ser humano é capitalista, mas os donos do capital são a minoria da população. Os empregados vivem dos salários pagos em troca de sua força de trabalho. O objetivo do capitalismo é dar retorno (lucro) aos donos do negócio. No capitalismo a “luz principal” é crescer e ter mais.

Ora, como ter mais, acumular bens e dinheiro, sem que falte a alguém? Sem que desequilibre a harmonia e dignidade do convívio social?

Vou além das definições e regras do direito público e privado, recorrendo ao Catecismo da Igreja Católica, no seu parágrafo 2424: “Uma teoria que faz do lucro a regra exclusiva e o fim último da atividade econômica é moralmente inaceitável. O apetite desordenado pelo dinheiro não deixa de produzir seus efeitos perversos. Ele é uma das causas dos numerosos conflitos que perturbam a ordem social. Um sistema que sacrifica os direitos fundamentais das pessoas e dos grupos à organização coletiva da produção, é contrário à dignidade do homem.”

Também, São João Crisóstomo lembra essa verdade em termos vigorosos: "Não deixar os pobres participar dos próprios bens é roubá-los e tirar-lhes a vida. É preciso satisfazer, acima de tudo, as exigências da justiça, para que não ofereçamos como dom da caridade aquilo que já é devido por justiça. Quando damos aos pobres as coisas indispensáveis, não praticamos com eles grande generosidade pessoal, mas lhes devolvemos o que é deles. Cumprimos um dever de justiça e não tanto um ato de caridade.”

Estas reflexões acima remetem a alguns acontecimentos: o desastre da barragem em Mariana-MG e o povo atingido sem amparo e compensações imediatas dos donos do capital, ou a grilagem de terras em áreas indígenas e de florestas, que não são para produção de alimentos básicos e sim para exploração de produtos lucrativos no mercado internacional. E mais, perto de todos nós, as mães e crianças excluídas de oportunidades, nos nossos semáforos pedindo ajuda. A solidariedade, a justiça social e um estado forte que equilibre esta disputa desigual entre capital e trabalho, ainda é possível. São as únicas alternativas.

Artigo publicado no Jornal de Jundiaí em dezembro/2015: http://www.jj.com.br/colunistas-1991-dignidade-e-capitalismo

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